Laços Capítulo Sete

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Capítulo Sete

O celular de André tocou. Ele e Carly pareceram despertar e o rapaz pegou o iPhone na mesinha de centro. Era Angélica, perguntando se ele chegou bem e reclamando porque o filho não ligou. André acalmou-a, dizendo que estava tudo bem. Carly terminou a pizza e levantou-se. André olhou para ela, enquanto despedia-se da mãe.

— Não vai comer mais? — perguntou André, olhando para cozinha.

— Ah, não. Estou cheia.

— É, acho que uma grande foi demais, né? — André levantou-se e foi para a cozinha, com seu prato e a caixa com um quarto da pizza. Carly lavou a louça e ele secou e guardou.

Depois, Carly disse que ia para o quarto, terminar de ler o livro. André não se opôs, porque sabia que a moça gostava de ficar sozinha. Ele ficou no sofá, assistindo a um filme.

***

Carly estava em um parque, com sebes verdinhas, pássaros cantando e um panapaná sobrevoando as flores, além de lebres que passaram pulando perto dos seus pés. Caminhou um pouco, então viu uma mulher de vestido branco e cabelos rubros, cuidando de uma roseira.

— Mãe — falou Carly e a mulher virou-se, sorrindo.

— Oi, Cá. Seja corajosa, querida.

Carly ia responder, mas a mulher saiu andando. Ela pediu para esperar, mas a mãe continuou e logo a moça a perdeu de vista. Carly gritou Mãe!... e não viu o buraco logo a sua frente. Gritou e... acordou, sentando-se na cama. Não pôde evitar o choro. Levantou-se e saiu do quarto. A porta do quarto de André estava aberta, mas ele não estava em lugar nenhum do apartamento. Onde ele teria ido? A moça sentou-se no sofá, abraçando as pernas. Ficou assim até André voltar, minutos depois.

— Lyly — chamou o rapaz, ao ouvir o som de choro. Ele foi até ela, no sofá. — O que aconteceu?

— Eu sonhei com minha mãe...

— Calma, Lyly. Foi só um sonho — disse André e a abraçou. Afagou-lhe os cabelos.

Carly acalmou-se, depois de um tempo, e se afastou, enxugando as lágrimas. Perguntou a André onde ele estava. O rapaz falou que tinha descido para levar o restante da pizza aos moradores de rua.

— Quer que eu faça um chá? Acho que pacotes de chá tem aqui.

Carly assentiu e André foi para cozinha. Enquanto observava o rapaz preparar o chá, Carly pensou que talvez ele não fosse tão amargo quanto ela pensava. Talvez fosse apenas uma camuflagem para esconder o medo que tinha de confiar e ser decepcionado de novo.

***

O Empório MimoSweet era construído no mesmo estilo, com poucas alterações, nas diversas cidades onde estava instalado. Tinha portas de vidro e as mesinhas de vidro e metal comportavam quatro pessoas. A um canto havia um pequeno palco, com uma bateria, um teclado, um microfone em um pedestal, uma guitarra e um baixo em suportes. Na manhã seguinte, depois de se arrumarem, André e Carly foram até o shopping, tomar café na filial do Empório, antes de ir para o aeroporto. André aproveitou para conversar com o gerente, sobre a situação da loja.

— Devo confessar que houve uma queda nas vendas, mas acho que nada que não possa ser recuperado... mas... — O homem parou e olhou de André para Carly.

— Pode falar — disse o mancebo. — Lyly é da família.

Carly achou estranho a colocação. Ela ser irmã de Lucy não a fazia ser da família.

— Bom, é que está difícil lidar com os fornecedores, por causa das contas antigas.

— Eu estive observando as contas e foi uma surpresa descobrir que devemos tanto, com todo o lucro que temos — comentou André.

— Alguns estão tentando uma renegociação, mas o sr. Ferreira prometeu colocar tudo em dia. Eles estão na espera.

***

 

O avião pousou no Aeroporto Santos Dumont, à uma e meia, por causa do atraso no voo. Tiago estava esperando por Carly e André. Lucy não pôde ir porque estava ajeitando os últimos detalhes do desfile. Carly ficou observando o Cristo Redentor, pela janela, enquanto o carro avançava até o Leblon. Tiago parecia anormalmente calado e André percebeu isso, mas não quis comentar nada na frente de Carly. Ela estava preocupada com a irmã e sabia que, se o irmão estava com problemas, não falaria.

— Bem-vindos de novo à nossa casa — disse Tiago, ao entrarem no apartamento, no quarto andar do prédio.

Carly sorriu, olhando ao redor, lembrando-se da primeira vez em que esteve ali, quando Lucy foi conhecer sua nova casa. Tiago indicou o quarto de Carly, segunda porta, à esquerda, e o de André ficava à direita.

Lucy chegou às quatro. Ela e Carly abraçaram-se, felizes, comentando da saudade e como era bom se ver de novo.

— Viu o vestido que deixei pra você? — perguntou a mais nova. — Desenhei especialmente.

— Eu vi. It’s beautiful. Thanks[i] — disse Carly, sorrindo.

— Andy, tudo bem? — Lucy abraçou o cunhado. — Obrigada por trazer a Carly.

— E deu um trabalho — falou André, sorrindo. — Quase precisei amarrar e jogar nas costas.

— Mentira — disse Carly, fuzilando-o com o olhar.

— Vamos, Villaça, diga a sua irmã que não queria vir pro desfile dela.

— Quê? — Lucy olhou, incrédula, para Carly. — I can’t believe in it[ii].

— Cala boca, Ferreira — aborreceu-se Carly. — Não, Lu, eu só estava, sabe... eu tenho que trabalhar na segunda...

— Vou fazer de conta que não ouvi isso — Lucy saiu e Carly foi atrás dela, depois de olhar feio para André.

O rapaz aproveitou a ausência das duas para perguntar a Tiago como estava o primeiro mês. O irmão respondeu: Bem.

— Bem? Só isso? Pro cara que disse que estava confiante, que encontrara a mulher da vida dele... Vocês já brigaram?

— Não — falou Tiago. — Só uma discussão...

No quarto, Carly fechou o vestido de Lucy. A mais velha pediu desculpas e, logo, tudo estava resolvido.

— Lu... você e Tiago... estão bem? — Carly olhou para o perfil da irmã enquanto ela passava delineador. Lucy terminou e fechou o delineador.

— Na maior parte do tempo, sim, mas... Ele tem saído, sabe — falou, olhando para baixo. — Ele diz que só estava com os amigos, mas chegou depois das dez. Fiquei com raiva — ela olhou para irmã. — Um mês apenas e ele já está me deixando sozinha... ele reclama o tempo todo que eu não arrumo as coisas, que eu reclamo demais, mas... — Lucy sentou-se na cama. — Só falei que estava com saudades de casa e que ele me deixa sozinha.

Carly segurou a mão da irmã, sentando-se ao lado dela.

— Ah, dear, eu falei que esse começo seria difícil. Vocês são muito novos e vai demorar um tempo pra se desapegarem da vida de solteiros. Mas, olha, vai ficar tudo bem. Sei que o que Tiago está fazendo é errado, mas também tente não reclamar tanto... e ser mais organizada. Sempre tivemos esse problema, lembra? — Carly sorriu. — E tu se esforçava pra arrumar um pouco... tente se esforçar agora. Não renove o ciclo... se ele sai pra não ouvir você falando, não reclame quando ele voltar tarde. Apenas diga que não vai aceitar que ele fique vivendo como solteiro. Deixe a escolha para ele.

— Tiago também fala que eu não sei cozinhar.

— Bom, ele sabia disso. Mas você pode tentar, pelo menos nos fins de semana. Sei que trabalha muito, mas tenho certeza que ele ficaria feliz. Vocês ainda não têm ninguém aqui, né? Pra fazer o serviço doméstico.

— Não.

— A culpa é minha. Acostumei você mal, Lu — Carly abraçou-a. Lucy ficou feliz por sua protetora estar ali.

Tiago entrou no quarto. Ele parou ao ver as irmãs abraçadas; elas afastaram-se.

— Quando quiser ir, Lu...

— Fala sério. Nessa casa não tem nada pra comer, não, é? — perguntou André, da cozinha.

— Droga! Esqueci de fazer compras — disse Tiago, frustrado.

André apareceu na porta do quarto.

— Vou fazer compras. Vem comigo, Lyly?

Lucy olhou para Carly, que ruborizou. A mais nova estranhou o apelido tanto quanto a mais velha. Tiago olhou para André, mas ele não percebeu. Carly levantou-se e Lucy pediu para eles não demorarem.

— Perguntei ao Tiago — falou André, quando saíam do prédio. — Ele disse que está tudo bem.

— Pois Lu me disse algo totalmente diferente — falou Carly, olhando para ele.



[i] É lindo. Valeu.

[ii] Não acredito nisso.


Laços Capítulo Seis

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Capítulo Seis

Carly entrou no apartamento de André, no oitavo andar do prédio Mansão Margarida Costa Pinto e prendeu o fôlego. O apartamento era maior que sua casa, com várias janelas e decorado lindamente. Não havia nada que identificasse a influência de André ali, mas Carly logo percebeu o gosto refinado de Angélica. Ela não pôde evitar exclamar o quanto era maravilhoso.

— É — disse André, puxando as malas dele e de Carly, ao entrar. — Meu presente de dezoito anos. Está no meu nome, mas toda a família fica aqui quando precisa vir a Salvador. Não gosto dessa cidade. Pro Tiago, um apartamento no Leblon; pra mim, em Salvador.

— Com dezoito, eu fiquei feliz por, enfim, poder assinar um contrato e trabalhar de verdade — falou Carly.

André ficou constrangido. Ele sabia que a moça perdera a mãe com dezessete anos e começou a trabalhar, com dezoito, para ajudar a cuidar de Lucy. Os tios davam tudo que precisavam, mas Carly era do tipo que não gostava de incomodar nem de se sentir um peso.

— Vamos ficar sozinhos aqui, mas não tente nenhuma gracinha — continuou ela, percebendo que André ficou sem graça com seu comentário.

— Acha que vou te atacar ou algo assim? — perguntou ele, rindo, e se aproximou de Carly. — Ou tá com medo? Tá com medo de olhar nos meus olhos... — Para — disse Carly, afastando as mãos de André quando ele começou a fazer cócegas nela —, porque sabe que pode não resistir... — cantou ele, olhando para ela, que estava vermelha.

— Está errado — falou ela. — Porque sabe que não vai segurar... Tenho medo de olhar nos seus olhos, porque sei que posso não resistir...[i]

— Então confessa — ele sorriu e ela levantou os olhos. Seus olhares cruzaram-se e André parou, preso pelos olhos castanhos de Carly. Ela desviou o olhar e ele afastou-se. Pegou as malas e saiu pelo corredor.

— Você pode ficar aqui — disse ele, ao abrir a porta da primeira suíte.

A moça entrou e viu que o quarto era tão lindo quanto a sala.

— Esqueci de pedir à faxineira pra comprar comida. Então podemos pedir, sair pra jantar ou comer no Empório — disse André. — O que você quer?

— Ahn... se quiser pedir, tudo bem.

— O quê? Pizza? Metade americana e metade espanhola?

— Pode ser — falou ela, sorrindo.

— Ok — André sorriu. — Fica à vontade. Mi casa es su casa. — Ele saiu e fechou a porta.

Carly ficou parada, ainda observando o quarto. Era tão estranho para ela, todo aquele luxo. Era totalmente surreal estar ali. Nem em seus sonhos mais loucos imaginou, um dia, estar no Mansão Margarida Costa Pinto, no Vitória. Mas, ao mesmo tempo, era totalmente dispensável tudo aquilo; poderia estar no seu quarto agora e seria ótimo — até melhor. Ela abriu a mala, pegou a toalha e o sabonete, mas, ao entrar no banheiro, havia sabonete de várias marcas e perfumes, além de toalhas felpudas. Carly ficou um pouco tentada a usar a banheira, mas decidiu pelo não.

Ao terminar de se arrumar, ela voltou à sala. André estava sentado no sofá, mexendo no celular. Ele tinha os cabelos meio molhados e vestia uma calça cinza e uma camisa branca. Carly ainda achava estranho vê-lo com roupas tão à vontade, já que ele sempre usava vestes sociais.

André observou Carly, com seu vestido longo, azul com florezinhas brancas, antes da moça sentar-se. Eles ficaram em silêncio, enquanto Carly assistia à novela, até André dizer que avisou Tiago que tinham chegado. Carly disse que avisou Lucy também.

— Tô com fome — disse André. — Eles foram fazer a pizza nos Estados Unidos ou na Espanha?

— Você reclama demais, Ferreira — falou Carly, olhando para ele.

— Odeio esperar.

— Nasceu de sete meses por acaso?

— Oito — falou André. — Passei um tempo na incubadora e quase morri.

Carly olhou para ele.

— Sério? — André balançou a cabeça, afirmativamente. — Não sabia disso.

— Tem muitas coisas que não sabe sobre mim, Villaça — André sorriu para ela.

— Então, vamos fazer um jogo — disse Carly, mudando de sofá, para sentar-se perto de André, que olhou para ela, esperando. — Tu pergunta alguma coisa que quer saber sobre mim e vice-versa e depois, tem que responder a própria pergunta. Ok?

André concordou, mas o interfone tocou e ele foi atender. Era o porteiro, avisando que o entregador chegara. A campainha tocou, dois minutos depois, e André atendeu. Ele voltou com a pizza. Carly observou que ele pediu suco de laranja para ela, seu preferido. Era uma surpresa para ela, André se lembrar. Os dois sentaram-se em almofadas, no chão, e começaram a comer.

— Então, o jogo — lembrou o rapaz. — Primeiro as damas.

Carly sorriu.

— Qual sua cor preferida?

— Homens não têm cor preferida.

Carly olhou para ele, incisiva.

— Deixa de ser machista.

André sorriu.

— Talvez azul. E a sua?

— Azul.

— Qual seu filme preferido? — perguntou ele.

Escritores da Liberdade — falou ela. — Sabe, eu gostaria de ser como a Gruwell. Eu teria fugido daquela escola, no primeiro dia. Mas ela tem vocação para ser professora e admiro quem tem... E o interessante é que é uma história real e ela transformou a vida daqueles jovens para sempre.

— Pensei que fosse Harry Potter... ou alguma comédia romântica, algo bem meloso, tipo Vestida para casar.

Carly engoliu o pedaço de pizza que estava mastigando.

— Choro todas as vezes que assisto… — André riu. — E o seu?

— Não tenho um filme preferido, gosto de ficção científica. Assistiu Na Mira dos Assassinos?

— Mas não é ficção científica... — Carly fez uma careta.

— Não, é que o cara... sabe, o marido… apesar de ter errado, ele está tentando consertar as coisas, mesmo que a família não acredite mais nele. E mesmo depois de arrancarem o dedo dele, o cara volta pra buscar a aliança.

Carly olhou para André por uns segundos.

— Gostaria que seu pai tivesse voltado atrás? — André não respondeu, mudou de assunto:

— Só não diz ao Tiago que eu gostei de um filme B. Ele vai perder o respeito por mim — ele riu. — Caso não morra, como se imagina com mais de cinquenta?

— Era minha vez agora — tornou Carly e André sorriu. — Ahn... bom, eu queria ser igual a Jane Austen, escrever muito... e morrer aos quarenta e um.

— Ah, vamos lá, pense em um futuro mais promissor — incentivou André.

— Tá bom. Daqui a cinquenta anos quero estar feliz, casada, com meus quatro filhos e netos.

— Vai ter que escolher. Ou feliz ou casada — André sorriu e Carly deu um empurrão de leve no ombro dele.

— E era uma pergunta — lembrou Carly — e tu tem que responder à própria pergunta. Está se esquivando, André Pedro.

— Quer saber uma coisa que odeio? — perguntou ele. — Que me chamem de André Pedro.

Carly olhou nos olhos de André, mas ele desviou-os logo, voltando a atenção para pizza.

— E você? Se acreditasse no amor e fosse se casar...

— Quem disse que não acredito no amor? — perguntou ele. — Não acredito nessa baboseira romântica que tu acredita, mas eu acredito no amor.

— Qual o nome dela? — soltou Carly.

— De quem? — André levantou os olhos do prato.

— Da sua ex-noiva — continuou ela, fitando-o. — Da mulher que fez você se tornar um amargo e cético.

— Poxa, sou amargo e cético? — perguntou André, rindo. — Quer saber o nome, o que aconteceu, por que não casei... pra fofocar com suas amigas.

— Odeio fofoca — cortou ela.

André ponderou se deveria contar. Mas Carly parecia digna de confiança. Há muito tempo que não falava sobre isso, mas poderia tentar.

— O nome dela era... é Lorena — disse ele, olhando para frente. — Eu conheci ela na faculdade. Ela fazia Moda e trabalhava, às vezes, como modelo. Eu me apaixonei e sabia que era a mulher da minha vida. Namoramos um ano e eu a pedi em casamento. Seis meses depois estava tudo pronto. Faltava uma semana e eu fui até a casa dela, para visitar, como sempre. Ela estava de malas prontas para ir para Nova York. Devolveu o anel e disse que não podia casar comigo. Aí, depois eu descobri que ela tinha ido se encontrar com Edgar, que eu considerava meu melhor amigo.

Carly olhou para André, enquanto ele fitava o copo e depois verteu o refrigerante. Ele estava tentando parecer displicente, mas parecia totalmente incomodado. André olhou para Carly.

— Agora você.

— Eu o quê? — perguntou ela.

— Sei que teve um namorado e terminou. E ele casou logo depois.

— Ah, quem gosta de fofoca? — alfinetou ela. — Lucy deve ter contado pro Tiago e ele pra você.

— É. Queria saber por que tu, sendo tão bonita e inteligente, estava solteira.

Carly ruborizou. Não sabia que André a via assim — tão bonita e inteligente. Também não imaginava sendo tema de conversa e interesse dele.

— Eu e Marcele éramos colegas e amigas desde sempre. Douglas entrou na nossa sala, na sexta série, e se tornou nosso amigo. No primeiro ano, eu já era apaixonada por ele. No segundo, ele quis ficar comigo — Carly olhava para baixo enquanto falava. — Eu disse que não gostava desse negócio de ficar e ele me pediu em namoro. Mas quando mamãe morreu e eu fiquei mal, ele foi se afastando. Depois, ele terminou comigo e, na semana seguinte, descobri que estava com Marcele... bem antes de tudo acabar, na verdade. O ano letivo acabou e, alguns meses depois, soube que tinham casado porque ela estava grávida.

Eles ficaram em silêncio, enquanto André fitava Carly. Ela estava triste e ele arrependeu-se de perguntar.

— Ele é um idiota — falou o mancebo e a moça olhou para ele. O rapaz sorriu.

Ela também — Carly devolveu o sorriso. — Estamos melhor sem eles.

André concordou e eles continuaram comendo.

— Não preciso nem perguntar qual seu livro preferido, né? — perguntou André.

— Não. Harry Potter... e o seu? — devolveu Carly.

— São tantos livros bons... acho que A Guerra dos Mundos, de H. G. Wells. — André serviu outra fatia de pizza para ele e para Carly. — Qual seu maior segredo?

Carly olhou para ele.

— Que pergunta é essa?

— Vale qualquer pergunta, não?

Não — declarou ela.

— Por quê? Você matou alguém? Mentiu pro seus tios e saiu pra beber? — perguntou o rapaz, rindo. — Ah, então a certinha Lyly tem um grande segredo — Carly olhou para pizza no prato, séria. André observou-a por um segundo. Ele percebeu que ela ficara triste. — Estava brincando, Carly.

— Não — disse ela e olhou para ele. — Não é um segredo, sabe. Mas eu deveria ter contado a Lucy e nunca disse. Sobre nosso pai — André continuou olhando para Carly e ela percebeu que poderia confiar nele. — Ele não foi embora, simplesmente. Estava morando no Uruguai, com outra mulher, pelo que minha tia soube. E morreu há dois anos.

André olhou nos olhos de Carly.

— Eu não sei como contar a Lu. Já ensaiei várias vezes e desisti — Carly balançou a cabeça. André abraçou-a e ela aceitou o gesto. Depois, ela afastou-se e os dois olharam-se nos olhos. Carly sentia o perfume de André enquanto ele aproximava-se...




[i] Trecho de Amor que fica, gravada por Zezé Di Camargo e Luciano, com participação de Ivete Sangalo. Compositores: Tivas, Juarez e Roger.

 

Laços Capítulo Cinco

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Capítulo Cinco

Pouco depois do almoço, Carly despediu-se dos tios. Tia Salomé mandou beijos para Lucy e Tiago e pediu para dizer o quanto estavam orgulhosos da caçula. Enquanto isso, Eli chamou André de lado:

— Cuidado com minha sobrinha, viu? Não vai querer saber do que sou capaz — disse Eli, severo.

— Não se preocupe, seu Eli — falou ele. — Vou devolvê-la tão perfeita quanto foi.

André abriu a porta do carro para Carly. Ela acenou quando ele deu a partida. Carly fechou os olhos e fez uma oração, mentalmente, pedindo a Deus para protegê-los na viagem. Depois, ela pediu para colocar um CD. André falou que ela poderia colocar o que quisesse. Carly pegou o CD 19, de Adele, na bolsa, e colocou no som; pulou para a faixa três e Chasing Pavements começou a tocar. Carly mandou uma mensagem para Lucy, dizendo que estavam a caminho de Salvador.

Legal! Esperando vcs ansiosos. Boa viagem — a irmã respondeu.

Carly pegou um livro e o abriu.

Razão e Sensibilidade — falou André, depois de olhar rapidamente para Carly.

Ela olhou para o mancebo.

— Já leu?

— Não. Da Austen, só li Mansfield Park. Assisti ao filme.

— Catita, né? — ela sorriu.

André balançou a cabeça, sorrindo.

Catita? Onde você arranja essas palavras?

— Gostou do filme?

— É legal. A reunião dos professores de Harry Potter, antes de Hogwarts.

Legal? Só isso? É tão frio quanto Edward — criticou Carly.

André olhou para ela, sorrindo, e de volta à estrada.

— E você é sentimental demais, igual Marianne.

A moça olhou do livro para o rapaz. Havia uma folhinha nos cabelos de André, que ela não reparou antes. Carly esticou a mão e pegou a folha. André olhou para ela.

— Estava no seu cabelo — ela mostrou a folhinha.

— Ah, deve ser lá do sítio — disse ele.

— Como está sua vó Nita? Faz tempo que não a vejo.

— Bem. Mandou lembranças, aliás. Esqueci de falar.

Carly agradeceu e voltou ao livro. André voltou o CD para faixa três e ela sorriu.

— Começou a ler Austen por causa da Stephenie Meyer, né? — perguntou André, depois de um tempo, quando Carly fechou o livro.

— Depois tem gente que diz que Crepúsculo não é cultura. Pense em quantas pessoas leram clássicos, como O Mercador de Veneza, Romeu e Julieta, O Morro dos Ventos Uivantes, por causa da série — Carly ficou em silêncio um momento, observando a vegetação, enquanto avançavam. Ela olhou para André. — Sua mãe não quis vim? — perguntou Carly.

— Não. Disse que tinha uma reunião importante, da igreja, amanhã.

— Acha que Lu e Ti estão bem? — perguntou Carly. — Sabe, felizes.

— Acho — respondeu André. — Por quê? Ela falou algo?

— Não. Mas eles são tão jovens e... essa fase do começo, às vezes, é complicada — ela olhou para ele. — Acha que eles estavam de fato preparados?

— E quem está? — André sorriu.

— Você quase casou. Deve ter... — mas Carly parou, quando André ficou sério e mexeu-se, desconfortável, apertando mais o volante. — Desculpa, eu...

O rapaz não falou nada por uns minutos.

— Pode ter certeza que é mais fácil estar preparado para o casamento do que para ser trocado.

Carly olhou para as mãos e eles ficaram em silêncio, por alguns minutos. André sabia que Carly também havia sofrido uma decepção, mas nunca ouviu a história dela própria. Depois de um tempo, Carly abriu o site da Rádio +Music, no computador de bordo, e eles ficaram ouvindo. Até ela perguntar se eles parariam em algum lugar.

— Por quê? — perguntou André, olhando para ela.

— Preciso ir ao banheiro.

Um tempo depois, eles pararam em uma posto de gasolina. Carly olhou para André e o rapaz soube que ela não queria ir sozinha. Os dois desceram e André ficou na frente da porta do banheiro feminino, esperando Carly, segurando a bolsa dela. Havia outro rapaz parado ali, segurando uma bolsa com o desenho de uma sereia.

— O que a gente não faz por elas, né? — ele sorriu. — Já paramos umas três vezes desde que saímos de casa. Estamos indo pra casa da minha sogra... o bom da sogra é que se ela não existisse, o amor da nossa vida também não existiria, né?

André apenas assentiu, percebendo que o homem achou que ele e Carly eram um casal. Carly saiu do banheiro junto com uma moça, que sorriu para o rapaz parado junto com André. Ele reparou que ela estava em estado de graça, com a barriga formando um discreto volume sob o vestido amarelo, antes de o casal sair. André entregou a bolsa de Carly e eles foram até a lanchonete. Ele comprou um açaí com guaraná e ela, um pacote de batata-frita e um suco. Os dois voltaram para o carro.

— Não vai cochilar, hein — disse ela, olhando para ele, que tomava um grande gole da bebida.

— Sabe que eu não durmo — falou ele, colocando o copo no porta-copos e apertou o botão de ignição. — Sou quase um vampiro — André sorriu.

— Coitado — debochou ela, abrindo o pacote de Ruffles.

— Essas coisas vão te matar antes dos cinquenta anos, sabia?

— E quem quer viver mais de cinquenta anos nesse mundo infeliz? — devolveu Carly.

— Se eu não me engano reclamou que estava gorda, mês passado.

— Tá me chamando de gorda? — Carly olhou, incrédula, para André.

— Eu não disse isso, tu que disse — defendeu-se André.

Carly ficou quieta. André olhou para ela, furtivamente, e percebeu que ela ficara magoada. Sentiu-se mal por isso. Ele tomou o pacote com a mão direita; segurou-o no volante, com a esquerda, e pegou uma batata.

— Pronto, morreremos os dois — disse André. Carly não disse nada. Ele olhou para ela, rapidamente. Esticou o braço e deu uma beliscadinha na cintura dela. — Pra mim, está ótima.

— Presta atenção na estrada — falou ela, séria. Mas André continuou fazendo cócegas nela e Carly sorriu. — Para de graça, Ferreira. Acaba matando nós dois.

— Oxe, não queria morrer antes dos cinquenta anos?

Ela olhou para ele e ele para ela e os dois riram, desviando o olhar.


 

Laços Capítulo Quatro

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Capítulo Quatro

 

Um mês depois, Carly sentia ainda mais saudade de Lucy e sabia que esse sentimento nunca passaria. Mas ela não tinha tempo para se sentir mal. Por mais que aquela sensação de desânimo e cansaço a fizesse não querer levantar da cama, Carly tinha que dar aulas. Ia ao Centro de Educação Vagalumes, pela manhã nas segundas, quartas e sextas, e à tarde nas terças e quintas, para as aulas de reforço. Começou a escrever duas histórias, mas acabou deixando de lado. Até pensou em começar outra pós-graduação, em Espanhol agora, mas abandonou a ideia. Tudo que queria, no tempo livre, era deitar, ler e ouvir música. Tia Salomé insistia que ela deveria sair mais e arranjar um namorado. Carly acreditava que um namorado não era o que precisava no momento. Não que ela não quisesse, mas os rapazes pareciam, em sua maioria, loucos, viciados e pegadores.

— Cá, um dia seu tio e eu vamos morrer... — falou Salomé.

— Tu vai primeiro — brincou tio Eli, sem tirar os olhos do telejornal.

— Precisa ter uma família — continuou a mulher.

— Deixa a menina, Sá. Na hora certa, ela vai achar um namorado e vai casar. Carly precisa de amigos próximos.

— Eu tenho amigos próximos... — falou Carly e seus olhos encontraram os do tio. Ela aceitou que ele tinha razão. Tinha algumas amigas, mas elas não eram o que se chamaria de próximas.

— O que acha de André, ahn? — questionou a tia. Carly olhou para ela.

— O que tem ele?

— Ele é um bom rapaz. Por que não investe nessa amizade? E depois, quem sabe? — tia Salomé sorriu, como se soubesse de um grande segredo.

Carly balançou a cabeça. Ela e André tinham se falado, algumas vezes, no último mês, e ele a convidou para acompanhá-lo ao Rio de Janeiro. Lucy ia ter alguns de seus modelos no desfile de primavera-verão da coleção da Wonderful Woman e queria sua irmã com ela. Foi uma surpresa; tio Eli e tia Salomé não poderiam ir, pois seriam padrinhos de um casamento.

 

Vai ao desfile da Lu? — perguntou André no chat do Facebook.

Não sei. Estou pensando — Carly respondeu.

Pensando em q? Eh o 1° desfile dela. Passo aí p/ te pegar. Vou  precisar passar em conquista.

 

Carly estava na sala do quarto ano. Ela sentou-se e estava fazendo anotações, enquanto os estudantes copiavam as questões do quadro. Maria Clara, uma das alunas, aproximou-se da mesa e perguntou se poderia ir ao banheiro. Carly sorriu, disse que sim e a menina saiu. Carly olhou para os outros e viu Pedro Henrique em pé ao lado de Jorge. Perguntou a ele se já havia terminado de copiar.

Yes, “títi” — falou o garoto, sorrindo.

— Traga seu livro, por favor — Pedro levou o livro para professora. — What is it, Peter?[i] Não. Vai copiar tudo de novo.

— Não, professora — implorou o menino.

— Tu é muito inteligente e capaz. Pode fazer melhor do que isso, se quiser. Come on. Só vamos sair daqui, hoje, quando seu livro estiver tão bom quanto eu sei que pode fazer. Laila, sente no lugar do Pedro, please. Quero ele aqui na frente.

Maria Clara voltou, alguns minutos depois, e anunciou:

— Professora, teu namorado taí fora.

Houve um “uhmmm” coletivo, enquanto Carly levantava-se e ia para a porta. Ela murmurou “Eu não tenho namorado” e abriu a porta. André estava parado ali, com as mãos nos bolsos da calça social preta. Ele disse hi, sorrindo. André observou o uniforme rosa-bebê de Carly e achou que ela ficava bem de rosa. Os cabelos castanhos, como sempre, desciam ondulados artificialmente sobre os ombros.

Hi — ela disse, quando o sinal tocou. Carly virou-se para turma e dispensou quem já tivesse terminado. Pedro ficou. As crianças despediram-se de Carly e saíram. A moça convidou André para entrar e fechou a porta.

— Já tá pronta? — perguntou ele.

— Ahn — Carly não olhou para ele, enquanto guardava tarefas no classificador e arrumava a mesa. — Mais ou menos.

Mais ou menos? — estranhou ele.

Alguém bateu na porta. Carly foi abrir e era um homem alto, de cabelos bastos, castanhos. Ele estava sério e parecia aborrecido.

— Bom dia, Sr. Aroldo — disse a professora, sorrindo.

Dia. Por que Pedro Henrique não desceu?

— Ele fez a atividade muito malfeita e o coloquei para refazer.

O Sr. Aroldo olhou para o filho. Pedro baixou a cabeça e escreveu com rapidez.

— Vamos conversar em casa — disse o pai. — Nada que um bom corretivo não resolva.

— Não, Sr. Aroldo — falou a professora, horrorizada. — Bater no Pedro não vai resolver.

— A senhora não sabe como esse garoto é uma peste.

— Mas surras não resolvem.

— E o que a senhora sabe sobre educar crianças? Não tem filhos — rebateu o homem.

— Não precisa falar assim com ela — disse André, aproximando-se.

— E quem é você? — perguntou o sr. Aroldo, fuzilando André com o olhar.

— Sou o concunhado da Carly, mas isso não vem ao caso — continuou o rapaz. — Bater no seu filho não vai resolver nada. Ele precisa de...

— Não venha me ensinar como devo criar meu filho.

— André, por favor — disse Carly, colocando a mão no braço do rapaz. Ele olhou para ela.

— Aroldo — chamou uma mulher baixa, de cabelos claros, presos em um coque, chegando à porta da sala. Ela não usava maquiagem e suas vestes eram pretas e fechadas.

— Falei pra esperar no carro, Enriqueta — falou o marido, ríspido.

— Estava demorando.

— Demoro o quanto quiser.

A mulher pareceu retrair-se mais. André e Carly entreolharam-se. Pedro pegou suas coisas, jogou-as na mochila e chegou a Carly, com o livro estendido. A professora parabenizou-o, sorrindo.

— Está vendo? Ficou bem melhor. Faça a atividade de casa, ?

. Valeu — disse Pedro, enfiando o livro na mochila. A mãe passou o braço pelos ombros dele e os dois saíram, apressados. Carly observou o pai segui-los pelo corredor.

André pegou a bolsa, os livros e o classificador de Carly, na mesa. Ele foi para porta, quando ela se virou para buscar os pertences. Carly fez menção de tomar os livros, mas André recusou, fazendo indicação para seguirem. Ao descerem e passarem pelo saguão, eles encontraram Natália, tia de André e diretora do CEV.

— Vão viajar hoje mesmo? — perguntou ela, sorrindo.

— Vamos — disse André.

— Cuida direito da Carly, hein? — Natália passou os braços em torno da moça. — Ela é uma joia preciosa. E cuidado nessas estradas, filho.

— Eu sei, tia — André sorriu.

— Que Deus os abençoe e façam uma boa viagem.

— Amém — disse Carly.

Ao chegarem ao portão, Carly despediu-se do porteiro e encontrou duas de suas colegas, Naiana e Taís. Esta desejou “Bom fim de semana”, enfatizando a primeira palavra, e aquela falou “Divirta-se”. Carly reparou no sorriso sugestivo delas e ruborizou, balançando a cabeça, negativamente. O Subaru azul de André estava parado em frente ao Centro de Educação Vagalumes. Carly lembrava-se de ter zombado de André por ele fazer questão de frisar que seu carro não era simplesmente azul — era Azul dos Mares do Sul. A moça disse que ele era muito metido e que pouco importava de que cor era seu carrinho de marca. André abriu a porta da frente para Carly e colocou as coisas dela no banco de trás. Ela hesitou.

— O que foi? — ele olhou para ela, depois de fechar a porta de trás.

— Tenho que avisar ao tio Eli. Ele vem me buscar — disse ela, para disfarçar.

— Eu avisei.

A moça olhou para ele e, depois, entrou no carro. André fechou a porta.

com medo de mim, Carly? — perguntou ele, olhando para ela, enquanto colocava o cinto. — Vou te levar pra casa. Não se preocupe — André colocou o celular no suporte e logo o som começou a tocar Don’t Look Back in Anger, do Oasis. Carly ficou quieta, ouvindo. Ela amava aquela música. — Então não terminou de arrumar as malas — falou André e apertou o botão de ignição.

— Nem comecei.

— Por quê? — André ficou surpreso.

— Não vou.

André olhou para ela e de volta para frente.

brincando, né?

— Não, é sério. Não tem como eu ir ao Rio, agora. Segunda, eu tenho aula.

— Não é possível que você esteja dizendo que não vai ao desfile — André balançou a cabeça.

— Não dá...

— É o primeiro desfile da sua irmã — falou ele. — Eu vim até aqui te buscar. Eu comprei as passagens de avião.

— Eu pago, ?

— A questão não é o dinheiro. Tu disse que ia. E a consideração com tua irmã?

André parou na frente da casa dela. Era uma construção de dois andares, pintada de verde-claro. Carly desceu, antes que André abrisse a porta para ela. Ele pegou os livros dela, no banco traseiro. Carly procurou as chaves na bolsa, mas não conseguia achar.

— Bom dia, Carly — ela olhou para cima e viu dona Eva espiando do andar de cima. — Sua tia deixou a chave. Parece que esqueceu no sofá... Posso jogar?

— Obrigada, dona Eva.

Carly aparou a chave e abriu o portão. Abriu a porta da casa, depois de passarem pela garagem vazia.

— Agora, ela vai falar pra todo mundo que eu cheguei com um homem — murmurou Carly.

André entrou na sala com sofás pretos e um rack mogno que comportava a TV, um som portátil e um aparelho de DVD. Ele colocou os livros de Carly na mesa de centro.

— Quer alguma coisa? Água, suco, café... — perguntou ela, indo para cozinha.

— Não... Quero uma resposta — disse André.

— Não posso faltar ao trabalho.

— Que se dane o trabalho.

— Pra você, que é rico e vai à empresa do papai quando quer... Não dá tempo fazer a mala...

André lembrava-se onde era o quarto das meninas, da última vez que estivera na casa. Mesmo sabendo que era falta de educação, saiu da cozinha e pegou o corredor. Carly foi atrás dele. André entrou no quarto de paredes rosas e azuis. Ele viu a mala sobre a cama de Lucy. Pegou-a e abriu sobre a de Carly.

— O que tá fazendo? — perguntou ela, quando André abriu a porta do guarda-roupa.

— O problema é arrumar a mala? — ele olhou para moça. — Vou te mostrar como faz. — O rapaz pegou um monte de roupas dos cabides, jogou na mala e fechou-a. — Pronto.

— Tu é muito lutrido — disse ela, fuzilando-o com o olhar.

Lutrido? — riu-se ele. — Minha avó fala isso. — André viu os CDs espalhados sobre a cama. — Olha só. Você ouve algo além da fossa de Céline, Adele e Maysa.

— Ah, é, porque as músicas da Alanis são totalmente alto-astral — disse Carly, ironicamente, abrindo a mala.

— É fã dela desde quando? — O rapaz sentou-se à escrivaninha e colocou o CD Flavors of Entanglement no som.

é uma palavra complicada de se usar hoje em dia. Mas eu comecei a ouvir Alanis, ano passado — respondeu Carly, enquanto Citizen of the Planet tocava.

— Fui ao show dela, em 2012. Foi muito legal. Quais suas músicas preferidas?

Ironic, Surrendering, Empathy, You owe me nothing in return, Hands Clean... Mas a melhor de todas é Incomplete. Gosto de ‘Til you e In praise of the vunerable man porque acho parecida com Harry e Gina. E tu?

Carly olhou para André, com um vestido na mão. Ele estava com seu caderno, lendo. Ela foi até a escrivaninha, furiosa.

— O que está fazendo? — quase gritou. André olhou para ela, surpreso. — Me dá.

Mas ele foi mais rápido. Levantou-se, segurando o caderno. — Você escreve fanfics.

— E daí? — Carly tentou pegar o caderno.

— Me amarro nas suas fanfics. Quer dizer, não sabia que era você... — disse ele, devolvendo o caderno.

— Tu fanfics? — perguntou ela, incrédula. — Nossa, pensei que o Sr. Maduro não fizesse coisas de adolescente — continuou, irônica.

— Ser maduro não significa deixar de fazer coisas de adolescente. Significa tomar responsabilidade pelas coisas de adulto que são exigidas de você.

— É a mesma pessoa que me disse que sou imatura quando a gente se conheceu? — perguntou ela.

— Eu disse isso? — perguntou ele.

— Disse. Porque eu disse que leio Crepúsculo, Harry Potter — ela olhou para ele.

— Seu problema é levar muito a sério as besteiras que eu falo.

André sentou-se de novo, enquanto Carly arrumava a mala. Ele ficou observando-a dobrar agilmente as peças. Na mão esquerda dela, havia uma aliança. Desde que se conheceram, André pensava em perguntar por que ela usava a aliança, mas ele achava que tinha a ver com a mãe dela; e talvez Carly não quisesse falar sobre isso.

— Lyly — falou ele, cauteloso. Carly levantou a cabeça. Lyly? Desde quando André usava apelidos para falar com ela? E Lyly — ninguém nunca a chamou assim. — Por que usa essa aliança?

— Ah — ela olhou para mão. — Era da minha mãe.

— Mas como quer arranjar um namorado se usa uma aliança? Todos devem pensar que é casada.

— Quem disse que quero arranjar um namorado? — perguntou a moça, voltando à mala.

— Carly? — chamou a voz de tia Salomé.

— No quarto, tia.

Tia Salomé apareceu na porta. Pareceu um pouco reprovadora de encontrar André no quarto da sobrinha, mas o cumprimentou com um sorriso, logo em seguida. Perguntou pela família, o trabalho, a viagem.

— Eu vim buscar a Carly. Temos que estar em Salvador, amanhã de manhã.

— Conseguiu convencer essa teimosa? Falei pra ela arrumar a mala, mas ficou “ah, tia, eu não vou...” Vão pra Salvador de carro, né?

— Sim.

— Vão passar a noite onde?

— No nosso apartamento da capital.

— E vão ficar sozinhos? — tia Salomé não gostou da ideia.

— Não se preocupe, dona Salomé — disse André. — Carly é irmã da Lu, que agora é minha irmã. Vou cuidar dela como se fosse uma das meninas da minha família — ele olhou para Carly, que evitou olhar para André e continuou arrumando as coisas. O rapaz compreendeu, então, o motivo de Carly estar tão arredia quanto à viagem.



[i] O que é isso, Pedro?